AUTOCONCIÊNCIA CURADORA


Autoconsciência curadora

“Se as portas da percepção estivessem livres,
tudo se mostraria ao homem como é, infinito”
                                                    William Blake

Desde os tempos mais remotos, as preocupações que assolam o ser humano sempre se constituíram na busca pela felicidade.

Experienciar um estado de bem estar e liberdade física, mental e espiritual.

Baseada na compreensão dos fenômenos mais sutis que animam o espírito e a matéria, a medicina tradicional chinesa, ciência manifesta a partir da filosofia do antigo Taoísmo da primeira China, antes mesmo do Imperador Amarelo, se propõe a auxiliar o individuo a encontrar e conservar sua saúde física e mental.

Saúde, bem-estar, longevidade, felicidade são produtos de uma vida em equilíbrio consigo e com o ambiente. Um corpo e espírito saudáveis são resultados de nossa própria escolha, de nosso modo de gerar aquilo que somos agora e aquilo que viremos a ser.

O microcosmo e o macrocosmo se unem em uma dança eterna no infinito do tempo e do espaço. Tudo é movimento, sejamos portanto este bailado e não um ponto fixo desarmonioso que luta para permanecer em um estado e época, aprisionados ao medo do vir a ser, do devir.

A psicologia tradicional chinesa nasce paralelamente à medicina e tem como base a relação harmônica entre o indivíduo e o meio, entre corpo e psique. Propondo o constante desenvolvimento da sinceridade, do senso de autocrítica e responsabilidade, do respeito e da pertinência de nossas escolhas, em busca de uma fluidez do ser.

 Podemos nos perguntar como um método essencialmente corporal, como a acupuntura, pode agir no plano mental?

Sobretudo na cultura oriental corpo, mente, emoção e espírito são tidas como estruturas interdependentes; assim, emoções como a tristeza, raiva, preocupação, medo, euforia são associadas a um órgão específico do corpo.

Convido você a mergulhar em novos modos de conceber o mundo, o ser-no mundo, e a embriagar-se do pensamento oriental, construindo nas entrelinhas dos conceitos que lhes serão apresentados, uma nova Presença, criando corpos, espaços e tempos diferentes, em um encontro com sua própria natureza criadora manifestando sua Essência, seu próprio ritmo, pulso guiado pelo coração, fluido como a água. 



TAO
o absoluto, a unidade, o infinito!!

No infinito, espaço e tempo estão fundidos, não há inicio ou fim, tudo é movimento, tudo se transforma constantemente.

O infinito é cíclico. O tempo não existe senão pela sucessão de acontecimentos. Passado, presente e futuro não têm sentido no infinito do tempo senão pela existência da matéria no infinito do espaço.

Estamos diante de um espaço colossal, infinitamente grande - sobre um planeta que é parte de um sistema solar, que é parte de uma galáxia, e assim sucessivamente  e, ao mesmo tempo, infinitamente pequeno  somos constituídos por células, constituídas de átomos...

Estamos sempre diante do infinitamente divisível e do infinitamente expansível.

O macrocosmos é reflexo do microcosmos. O que está embaixo é reflexo do que está no alto. Estamos situados em algum lugar entre o infinitamente pequeno e o infinitamente grande, e na eternidade do tempo.

O TAO nos permite uma tomada de consciência de nossa posição no espaço e tempo, a aceitação da constante transformação e mobilidade, a possibilidade de nos colocarmos em uma atitude serena diante dos acontecimentos, de onde nasce a aceitação que permite a mudança.

Somos todos uma parte da teia imensurável e inseparável de relações, é nossa responsabilidade perceber as possibilidades do amanhã. Somos os únicos responsáveis por nossas descobertas, palavras, ações, e pelos reflexos das mesmas no universo.

A natureza da mente é o próprio TAO, a mente é imortal, é ela que constrói a teia do espaço-tempo e cria a matéria - é a informação que nunca é destruida. Para ela não existe passado nem futuro.

"A distinção entre passado, presente e futuro é só uma ilusão, ainda que persistente"
Albert Einstein, 1955.

Tao é o Caminho onde não se distingue o caminhante do caminhar. Não há criador. O universo (o Céu e a Terra) apareceu (e aparece continuamente) a partir do Tao primordial, o que existe aparece do que não existia antes e é eterno.

 O universo é como um organismo vivo resultante da expansão vitalizada do Tao (a ordem natural, a providência). Manifesta-se continuamente no fluxo e refluxo constante de todas as coisas que existem e que foram criadas pela sua atividade.

O Tao não tem personalidade, o que vitaliza o universo são dois princípios ou substâncias que combinados são o Tao: o yang (luz, calor, criativo, masculino) - que existe especialmente concentrado no Céu - e o yin (sombra, frio, receptivo, feminino) - que existe especialmente concentrado na Terra.

O Tao é como o espaço vazio dentro de um vaso;

Mas, por mais que o enchamos, nunca ficará cheio.

É imensurável, como se fosse o Antepassado de todas as coisas. (Cap.4 Tao te Ching)

 “Cabe a ti mesmo descobrir, livrando-te do desejo e da emoção, vivendo sem esforço, sem o que chamas de ação, libertando-te de tudo que se opõe à Natureza, para que                                                                                                                        possas dominar a ação e não ser dominado por ela. Com um movimento tão calmo e  constante quanto o do oceano à nossa frente, deixa-te levar em direção ao Tao. O mar  não se move por ser esse seu desejo, nem por saber que é bom ou sábio assim fazê-lo.  Ele se move porque assim deve ser, sem que precise saber disso. Assim também te deixarás  levar em direção ao Tao, e quando lá chegares, nada saberás de tudo isso, pois então serás o Tão”                                                                 
                                                                                                                                                                        (www.caravansarai.com.br)





 QI
sopro

A energia (QI, sopro) é onipresente no infinito, podendo se manifestar de forma muito sutil, volátil, etérea, como o movimento, o som, o pensamento; ou se revestir de formas mais densas tornando-se matéria.

Tudo é energia! As diferentes naturezas da energia são o resultado do movimento das partículas que a compõem.

Yin e Yang são as duas seqüências do movimento cíclico que condiciona a vida sem, no entanto, encerrá-la em uma forma. Nenhuma das duas manifestações energéticas existe em estado puro, há em cada uma o germe da outra.

Yin apresenta características de imobilidade, interior, frio, solidez, profundidade, peso;

Yang é movimento, calor, impalpável, exterioridade, superficialidade, clareza, leveza;

Esses princípios são regidos pela lei da origem mutua, cada um nasce a partir da existência do outro; do crescimento e decrescimento, cada um cresce à medida que o outro decresce; controle mútuo, cada um é limitado, metrificado pelo outro; transformação, cada um tem a capacidade de se tornar o outro em caso de extremo desequilíbrio.

Vivemos imersos na força dinâmica em fluxo constante da cidade, seu sopro vital é o berço, a base de nosso próprio fluxo vital.

Qi não é a causa do movimento, mas é inseparável deste, é o próprio fluxo, a forma de todas as coisa, o sopro.

Apesar da energia Qi ser única, podemos classificá-la em 3 tipos, segundo suas funções:

          A energia ancestral, ou, Yuan Qi, nasce da união do óvulo com o espermatozóide e traz o código genético para cada ser. Ela decresce durante a vida e seu esgotamento é responsável pela morte não acidental. Yuan Qi,  se encontra principalmente na região inferior do abdome, estando presente também em todas células do corpo. A energia ancestral, após o nascimento, ainda precisa ser completada pelo Qi da nutrição.

          A energia da alimentação Yong Qi, é a energia essencial, proveniente do ar (Yeung Chi) e dos alimentos (Kou Chi).

          A energia defensiva, ou, Wei Chi, é responsável pela proteção e defesa do organismo, ou seja, imunidade;

O ser, suas partes criam o mundo, o todo; nós criamos constantemente a cidade onde estamos; nossas crenças, objetos, desejos e manifestações criam as condições de existência.

Com qual energia a cidade está sendo alimentada? Que fluxos energéticos estão abertos? Qual a qualidade do ar, a respiração da cidade? Do que ela se alimenta?

Uma energia que se consome na aceleração constante dos fluxos vazios, a falta de tempo para se alimentar, para respirar, a cidade pulsa na super-velocidade, vinte e quatro horas, sem parar.

O filósofo alemão Josef  Pieper, em seu livro Felicidade e Contemplação: Lazer e Culto, lembra que na Idade Média ensinava-se que: a ausência de repouso, a incapacidade de repousar, está em íntima relação com a preguiça; o trabalho irrequieto provém da preguiça (...), a preguiça de se perceber.


... quanto mais decretos proibitivos existirem,
Maior será a pobreza do povo;
Quanto mais armas existirem, maior será a desordem;
Quanto mais engenho e técnica existirem,
mais estranhos produtos aparecerão;
Quanto mais regras e regulamentos,
mais ladrões e bandidos haverá
(Tao Te Ching Cap.57)




 Harmonia
pilar fundamenTAO da existência



Sem harmonia nada se sustenta, nem o ser, nem a humanidade, nem mesmo Universo.

Podemos perceber padrões de harmonia, ou desarmonia, na organização genética, na constituição sanguínea, em idéias, pensamentos, conceitos, sentimentos...

A harmonia reflete a beleza, fluidez, amabilidade,  de cada gesto, palavra, pensamento... É fonte de prazer, criatividade, liberdade, ação...

Seres em harmonia constroem sociedades harmoniosas. Médicos em harmonia geram harmonia em seus pacientes, calma, tranqüilidade, confiança, apaziguando tensões pré-existentes.

Um estado harmonioso subentende equilíbrio dos elementos que constituem nossas escolhas, nossos atos, palavras, intenções. E supõe uma atitude de respeito a quaisquer as relações.

Saúde é o estado de completo bem-estar físico, mental e social, resultante de uma boa transformação e difusão da energia. É sinônimo de equilíbrio ideal do sistema energético.





Emoção
mergulho na compreensão da alma




A medicina chinesa concebe cinco estados emocionais de base, porém não devemos deixar de levar em conta a complexidade de cada individuo e a imensa variedade de interações energéticas e emocionais que o constituem. Assim devemos estar atentos para não categorizar de modo rígido as emoções, reduzindo o psiquismo a uma máquina grosseira.

Compreender as emoções é a base para a compreensão do espírito. Não vivenciá-las, ou vivenciá-las raramente, coloca o psiquismo em um estado de estagnação. A sopro mental deixa de ser estimulado, a relação corpo psique se enfraquece e, pouco a pouco, a comunicação corpo-espírito se rompe.

Sem harmonia nada se sustenta, nem o ser, nem a humanidade, nem mesmo Universo.

Podemos perceber padrões de harmonia, ou desarmonia, na organização genética, na constituição sanguínea, em idéias, pensamentos, conceitos, sentimentos...

A harmonia reflete a beleza, fluidez, amabilidade,  de cada gesto, palavra, pensamento... É fonte de prazer, criatividade, liberdade, ação...






 Corpo  Espírito  Consciência

Tríade que, se em equilíbrio e harmonia, permite que o pensamento, emoções, escolhas, expressões e ações se manifestem sem criar conflitos. Promovendo um profundo bem-estar e fluidez da atividade mental.

O equilíbrio corpo-espírito-consciência é resultante de nossas escolhas de vida. Para tal é preciso fortificar Po, Hun e Shen, que são as dinâmicas interiores, corporais, mentais e espirituais. Essas almas vivas fazem vibrar a multiplicidade de nossos sentimentos e criam nossa música interior, que nos faz vibrar em harmonia com o mundo a nossa volta.

Se queremos um corpo saudável devemos desejar um mundo saudável, e portanto, começarmos tornando sadia nossa mente, respeitosa nossa relação com a natureza e cooperativa nossa comunicação com os outros.


CORPO
Corpo TI

"O corpo diz o que as palavras não podem dizer"
Martha Graham


O primeiro nível que se manifesta no ser é o corpo, massa definida de matéria contendo o infinito. Composto por elementos interconectados por tecidos nervosos e líquidos orgânicos.

Po é a manifestação do corpo que exprime a experiência corporal e as sensações de nossas escolhas espirituais, veiculando maravilhosas e terríveis experiências. É a nossa memória corporal, contida no pulmão e no rim.

Um corpo nunca é o mesmo, a sua identidade é sempre diferida em cada experiência e a somatização constante dessas experiências de diferentes forças e intensidades faz o corpo.

O corpo se apresenta como uma enorme geografia, repleta de elevações e depressões, zonas quentes, frias e temperadas, zonas solitárias e desérticas, e campos e cidades populosas habitadas por palavras e discursos.

O  conceito de corpo vem sendo domesticado, corrompido, moldado e exposto para satisfazer os anseios das sociedades capitalistas.

O homem é um ser corpóreo e, como tal, revela sua história através de seus movimentos. O indivíduo está imerso num universo de práticas corpóreas, onde o ser cria e recria ao mesmo tempo várias possibilidades de movimentos em relação à sociedade, ao trabalho, a vida como um todo, único e subjetivo. Fazemos parte do mundo, agindo e interagindo a todo instante, numa troca recíproca entre indivíduo e meio.

O ser humano vive através de sua corporeidade, capaz de fazer a trajetória histórica do indivíduo que, na maioria das vezes, nem percebe essa dimensão que o corpo assume a todo instante.

O modo como vivemos hoje o Capitalismo afasta o ser humano do sentido coletivo de vida e o coloca no patamar individual, no sentido restrito da palavra.

O corpo é projetado para os anseios capitalistas da sociedade contemporânea, que busca alcançar padrões estéticos ditados por uma classe dominante, que anseia pela perfeição do corpo assegurada pelos recursos médicos e cirúrgicos, onde aqueles que não compartilham dessa tecnologia são excluídos do convívio social.
A mídia cria e recria situações que colocam o corpo em evidência, como as questões raciais, a sexualidade, a condição econômica, etc. Numa dualidade que afasta a consciência humana do seu eixo principal, qual seria o seu bem estar e a aceitação de si mesmo, afastando o homem de sua verdadeira essência corporal, do corpo que se satisfaz na diversidade das ações que pratica.

"Nossos corpos são nossos jardins, cujos jardineiros são nossas vontades Otelo, de William Shakespeare Ato I Cena III: Iago


ESPIRITO
Espírito Shen

"O espírito esboça, mas o coração modela".
Auguste Rodin


Palco onde se desenrolam as mais puras cenas de nossa persona. Exprime o nível mais elevado de nossa consciência, através da qual percebemos, em nosso íntimo, a realidade coletiva, a realidade objetiva do mundo. O espírito exprime a fluidez entre consciência e corpo.

O espírito se revela através de Shen, cuja clareza não se manifesta se este não estiver em harmonia com o corpo e a consciência.

Quando o espírito é perturbado perde sua morada no coração e sua errância pode levar à ascensão do vento interno  fator patogênico.  

A reflexão meditativa é ligada ao Shen, o espírito funciona graças ao Qi mental e se nutre de sensações e prazeres corporais. Toda ação, palavra, intenção ou pensamento deliberadamente altruísta, justo, nobre, nutre a consciência e a eleva. Ou, ao contrário, tudo que está em desacordo com o espírito e que é feito em apesar da desaprovação da consciência, amputa o conteúdo espiritual e enfraquece a consciência.

O espírito exulta-se através da reflexão, imaginação, ideação, meditação e alegria profunda (Bastide 2005:89)


CONSCIENCIA
Consciência Liang


"Há no fundo das almas um precipício
 inato de justiça e de virtude, com o qual nós julgávamos
as nossas ações e as dos outros como boas ou más;
e é a este princípio que dou o nome de consciência"
Jean-Jacques Rousseau


Consciência é a capacidade de perceber a relação entre si e o ambiente, é a Função mental de perscrutar o mundo. Sendo uma qualidade psíquica, é também um atributo do espírito, da mente, ou do pensamento humano.

A consciência é a essência do espírito, nos dá a capacidade de acordar nossa percepção profunda à realidade exterior e modificar o ambiente, o infinito.

É um instrumento de julgamento, de avaliação, enquanto o espírito é um potencial de compreensão e alimentação da consciência e de representação da persona.

O nível de consciência varia de um indivíduo a outro, em função do percurso e do trabalho efetuado no sentido do auto-conhecimento. Um nível de consciência elevado permite compreender e amar o outro muito mais facilmente.

Podemos estimular a consciência através da meditação , ou pensamento meditativo, mas ela pode também ser estimulada por fortes emoções.

A consciência comum é uma manifestação do Hun, cuja morada é o fígado, e a consciência superior uma emanação de Shen, cuja morada é o coração.

A consciência humana provém do Céu Anterior, do Yuan Qi da espécie; assim, nossos pais a transmitem no momento mesmo da concepção.

Mesmo a tentativa de buscar manter um espírito sadio em um corpo sadio é um objetivo que eleva o espírito e fortifica o corpo. O corpo subsidia e recompensa o espírito e, por sua vez, este sublima e transcende o corpo.

O equilíbrio corpo-espírito depende do livre fluxo, da ausência de conflitos ou dominações entre estes.
As atividades do organismo, a energia corpórea e as sensações corporais, sensoriais, sexuais e psicológicas, se ancoram no espírito, trazendo-lhe serenidade e a capacidade deste levar ao corpo a leveza de sua natureza yang, fazendo o corpo vibrar como um gongo.

A consciência é a reguladora, juíza, das atividades do corpo que se exprime como uma parte da personalidade. Sem controle, o corpo jamais conheceria seu limite, nem os limites da razão, agindo perigosa e impulsivamente, colocando em risco a si mesmo e a sociedade.

Os olhos da consciência intervêm sobre o corpo indicando o que é bom para o espírito.
Se o corpo age em desacordo com a consciência, o espírito será afetado, gerando normalmente um sentimento de culpabilidade.

A consciência se coloca entre o corpo e o espírito, servindo-os igualmente. Em sua relação com o espírito a consciência se manifesta separando o puro do impuro, permitindo a manifestação das mais belas qualidades de nossa psique.

Um espírito, consciente pensa o que diz e exprime o que pensa.

É preciso exercitar o cérebro, observar o pensamento e colocá-lo em consonância com a consciência.
Para os chineses, o espírito emana do coração, do cérebro e do equilíbrio entre os órgãos; contém a parte mais elevada de nossa consciência.

Se o espírito não ama o corpo, este perturbará o espírito e a consciência não poderá manifestar-se normalmente. A falta de amor próprio é um veneno mental que intoxica e destrói lentamente. Se o espírito compreende o corpo, aceita-o e ama, a consciência será livre.